O Que é Usucapião? Desvende os Tipos e o Processo para Regularizar Seu Imóvel

A usucapião é um mecanismo legal que garante a função social da propriedade, ou seja, assegura que um bem seja utilizado e cuidado, mesmo que o proprietário registral não o faça.

Neste guia completo, você vai entender em detalhes o que é usucapião, quais são os principais tipos reconhecidos pela legislação brasileira, os requisitos do usucapião para cada modalidade e como funciona o processo de usucapião, seja ele judicial ou extrajudicial.

o que é usucapião

Entendendo a Usucapião: Conceito e Fundamentação Legal

A usucapião é a aquisição da propriedade de um bem (móvel ou imóvel) pela posse prolongada, contínua, pacífica e com ânimo de dono, cumprindo os prazos e condições estabelecidos em lei. É uma forma de regularizar uma situação de fato, transformando a posse em direito de propriedade, reconhecendo o esforço daquele que deu utilidade social ao bem.

O fundamento legal para a usucapião no Brasil está principalmente na Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XXIII, que estabelece que “a propriedade atenderá a sua função social”. O Código Civil Brasileiro, a partir do artigo 1.238, detalha as regras e os diferentes tipos de usucapião, garantindo que a inércia do proprietário original não impeça a regularização daquele que, de fato, cuida e utiliza o bem.

Historicamente, a usucapião remonta ao Direito Romano, onde já se previa a possibilidade de adquirir bens pelo uso. No contexto atual, esse instituto jurídico promove a segurança jurídica e incentiva a ocupação produtiva de terras e imóveis, coibindo o abandono e a especulação.

Quais os Requisitos Essenciais para a Usucapião?

Para que o direito à usucapião seja reconhecido, é crucial preencher alguns requisitos do usucapião gerais, independentemente do tipo específico:

  • Posse Contínua e Ininterrupta: A posse deve ser exercida de forma ininterrupta durante todo o período exigido por lei, sem que haja abandono ou interrupção.
  • Posse Pacífica e Incontestada: O possuidor não pode ter sofrido qualquer tipo de contestação ou oposição judicial por parte do verdadeiro proprietário ou de terceiros durante o período de posse.
  • Ânimo de Dono ( Animus Domini ): O possuidor deve agir como se fosse o verdadeiro dono do imóvel, tomando as decisões, realizando benfeitorias, pagando impostos e contas, sem subordinação a ninguém. Isso diferencia o possuidor de um locatário, comodatário ou caseiro, por exemplo.

Além desses, dependendo do tipo de usucapião, podem ser exigidos outros requisitos do usucapião, como justo título, boa-fé, destinação do imóvel (moradia, produção) e não ser proprietário de outro bem.

Usucapião de Bens Públicos: É Possível?

É fundamental esclarecer que bens públicos (como praças, ruas, terrenos da União, Estados ou Municípios) não podem ser adquiridos por usucapião. A Constituição Federal veda expressamente essa possibilidade, visando proteger o patrimônio coletivo. O direito à usucapião se aplica exclusivamente a bens particulares.

usucapião

Os Diferentes Tipos de Usucapião e Seus Prazos

A legislação brasileira prevê diversas modalidades de usucapião, cada uma com prazos e requisitos do usucapião específicos. Conhecer cada uma delas é essencial para identificar qual se aplica à sua situação.

Usucapião Extraordinária

Esta é a modalidade mais comum e “menos exigente” em termos de requisitos do usucapião adicionais.

  • Prazo: 15 anos de posse contínua, pacífica e com ânimo de dono.
  • Dispensa: Não exige justo título (documento que, em tese, transferiria a propriedade, mas possui algum vício) nem boa-fé (desconhecimento do vício na posse).
  • Redução do Prazo: O prazo pode ser reduzido para 10 anos se o possuidor tiver estabelecido sua moradia habitual no imóvel ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.

Usucapião Ordinária

A usucapião ordinária exige um “plus” de boa-fé e um documento que, mesmo com falhas, demonstre a intenção de ser proprietário.

  • Prazo: 10 anos de posse contínua, pacífica e com ânimo de dono.
  • Exigências: Requer justo título e boa-fé. O justo título pode ser um contrato de compra e venda sem registro, uma promessa de compra e venda, etc. A boa-fé significa que o possuidor acreditava ser o verdadeiro dono do imóvel ao adquiri-lo.
  • Redução do Prazo: O prazo pode ser reduzido para 5 anos se o imóvel tiver sido adquirido onerosamente (com pagamento) e registrado no cartório (mesmo que o registro tenha sido posteriormente cancelado), e se os possuidores tiverem estabelecido sua moradia ou realizado investimentos de interesse social e econômico.

Usucapião Especial (Constitucional)

As modalidades especiais de usucapião visam garantir o direito à moradia e à função social da propriedade, com prazos mais curtos e requisitos específicos.

Usucapião Especial Urbana (Art. 183 CF/88 e Art. 1.240 CC)

  • Prazo: 5 anos de posse ininterrupta e sem oposição.
  • Requisitos do Usucapião: O imóvel deve ter até 250 m², ser utilizado para moradia do possuidor ou de sua família, e o possuidor não pode ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural.1

Usucapião Especial Rural (Art. 191 CF/88 e Art. 1.239 CC)

  • Prazo: 5 anos de posse ininterrupta e sem oposição.
  • Requisitos do Usucapião: A área não pode ultrapassar 50 hectares, deve ser tornada produtiva pelo trabalho do possuidor ou de sua família, o possuidor deve ter nela sua moradia, e não pode ser proprietário de outro imóvel rural ou urbano.

Usucapião Familiar (Usucapião por Abandono de Lar – Art. 1.240-A CC)

  • Prazo: 2 anos de posse ininterrupta e sem oposição.
  • Requisitos do Usucapião: Aplicável quando um dos cônjuges ou companheiros abandona o lar, e o outro continua a morar no imóvel (de até 250 m²) que era utilizado pelo casal para moradia, sem ser proprietário de outro imóvel.

Usucapião Coletiva (Art. 10 Estatuto das Cidades)

  • Prazo: 5 anos de posse ininterrupta e sem oposição.
  • Requisitos do Usucapião: Destinada a áreas urbanas com mais de 250 m² ocupadas por população de baixa renda, onde não é possível identificar a área individual de cada possuidor. Os ocupantes não podem ser proprietários de outro imóvel urbano ou rural.

Usucapião de Bens Móveis

Não são apenas imóveis que podem ser usucapidos. Carros, motocicletas, equipamentos, e até mesmo obras de arte podem ser objeto de usucapião.

  • Usucapião Ordinária de Bens Móveis: Exige posse por 3 anos, com justo título e boa-fé.
  • Usucapião Extraordinária de Bens Móveis: Exige posse por 5 anos, independentemente de justo título e boa-fé.

Como Funciona o Processo de Usucapião: Judicial e Extrajudicial

O processo de usucapião pode ser realizado de duas formas principais no Brasil: pela via judicial ou, em casos específicos, pela via extrajudicial. A escolha da via dependerá da complexidade do caso e da existência de consenso entre as partes envolvidas.

Processo de Usucapião pela Via Judicial

A via judicial é a mais tradicional e é obrigatória quando há litígio (disputa) ou quando o caso não se enquadra nos requisitos para a usucapião extrajudicial.

  1. Contratação de Advogado: A representação por um advogado é obrigatória no processo de usucapião judicial. Ele será responsável por analisar a documentação, enquadrar o caso na modalidade correta e protocolar a ação.
  2. Ação Judicial: O advogado entrará com uma “ação de usucapião” na Justiça. Será necessário apresentar provas da posse (fotos, comprovantes de residência, contas de consumo, testemunhas, etc.), levantamento topográfico e memorial descritivo do imóvel.
  3. Citação e Publicação: Os antigos proprietários (se conhecidos), confrontantes (vizinhos) e os interessados em geral são citados para se manifestarem. Editais são publicados para dar publicidade à ação.
  4. Instrução Processual: Nesta fase, são produzidas provas, como depoimentos de testemunhas e perícias.
  5. Sentença: Se todos os requisitos do usucapião forem comprovados e o juiz considerar o direito, ele proferirá uma sentença declarando a aquisição da propriedade.
  6. Registro no Cartório de Imóveis: A sentença judicial serve como título para que o imóvel seja registrado em nome do novo proprietário no Cartório de Registro de Imóveis.

O processo de usucapião judicial pode ser demorado, variando de acordo com a comarca e a complexidade do caso.

Processo de Usucapião pela Via Extrajudicial (Cartório)

Com o Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), foi facilitada a usucapião extrajudicial, tornando o processo de usucapião mais rápido e desburocratizado, desde que não haja litígio.

  1. Contratação de Advogado e Notário: Assim como na via judicial, a assistência de um advogado é indispensável. O pedido é feito diretamente no Cartório de Registro de Imóveis da comarca onde o imóvel está localizado, com o auxílio de um tabelião de notas.
  2. Documentação: É necessário apresentar uma série de documentos, como:
    • Ata Notarial: Lavrada por um tabelião, atestando o tempo de posse do requerente e de seus antecessores.
    • Planta e Memorial Descritivo: Assinados por profissional habilitado (engenheiro, arquiteto), com a devida ART (Anotação de Responsabilidade Técnica).
    • Certidões Negativas: Do imóvel e do domicílio do requerente.
    • Documentos Comprobatórios da Posse: Contas de consumo, comprovantes de impostos, declarações de vizinhos, etc., que demonstrem a origem, continuidade, natureza e o tempo da posse.
  3. Notificação e Publicação: Os proprietários registrais, confrontantes e a Fazenda Pública (União, Estado, Município) são notificados. Um edital pode ser publicado.
  4. Análise do Cartório: O registrador de imóveis fará uma análise de toda a documentação e, não havendo impugnação, procederá com o registro da propriedade em nome do requerente.

O processo de usucapião extrajudicial é uma excelente alternativa para quem busca agilidade, mas exige a ausência de qualquer oposição ou conflito.

usucapiao

Usucapião de Imóveis de Herança: É Possível Entre Herdeiros?

Sim, a usucapião de imóveis de herança entre herdeiros é um tema que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se manifestou favoravelmente, desde que preenchidos os requisitos do usucapião.

Imagine uma situação em que vários herdeiros recebem um imóvel, mas apenas um deles passa a residir e cuidar do bem, pagando todas as despesas e impostos, enquanto os outros herdeiros se omitem e não demonstram interesse na propriedade.

Nesse cenário, o herdeiro que exerce a posse exclusiva e com ânimo de dono, pelo tempo legalmente exigido, pode requerer a usucapião contra os demais co-herdeiros, desde que comprove a posse exclusiva e que os outros herdeiros abandonaram o bem.

Quanto Custa o Processo de Usucapião?

O custo do processo de usucapião varia bastante, dependendo da modalidade, da complexidade do caso (judicial ou extrajudicial) e do valor do imóvel.

Os principais custos envolvem:

  • Honorários Advocatícios: Geralmente, são o maior custo, podendo variar entre 10% e 30% do valor do imóvel, ou um valor fixo negociado com o profissional.
  • Custas Processuais: Taxas judiciais (na via judicial) ou emolumentos do cartório (na via extrajudicial), que dependem do valor do imóvel e da tabela de cada estado.
  • Serviços Técnicos: Custos com topógrafo para elaboração da planta e memorial descritivo.
  • Certidões: Valor para emissão das certidões negativas necessárias.

É fundamental solicitar um orçamento detalhado ao advogado e ao cartório para ter uma estimativa precisa dos custos envolvidos.

Dúvidas Frequentes sobre Usucapião

Quais bens não podem ser usucapidos?

Bens públicos (de União, Estados e Municípios) não podem ser adquiridos por usucapião.

É preciso ter um contrato para pedir usucapião?

Não necessariamente. Em alguns tipos, como a usucapião extraordinária, o contrato (justo título) não é um requisito.

Posso pedir usucapião de parte de um imóvel?

Sim, é possível usucapir apenas uma fração ou uma área específica de um imóvel maior, desde que haja delimitação e cumprimento dos requisitos.

O que acontece se o verdadeiro dono aparecer durante o processo?

Se o verdadeiro dono apresentar oposição judicial antes da conclusão do processo, a posse pode ser considerada contestada, inviabilizando a usucapião.

A usucapião se aplica a apartamentos?

Sim, a usucapião pode ser aplicada a apartamentos, desde que os requisitos específicos da modalidade escolhida sejam cumpridos.

Conclusão

A usucapião é um instrumento jurídico de grande relevância social, que busca regularizar situações de fato consolidadas pela posse prolongada e pelo efetivo uso da propriedade.

Entender o que é usucapião, seus tipos, os requisitos do usucapião e o processo de usucapião é o primeiro passo para quem busca a regularização de um imóvel ou deseja compreender melhor esse direito.

Lembre-se sempre de buscar a orientação de um advogado especializado para analisar seu caso e garantir que todos os procedimentos legais sejam seguidos corretamente.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima